
A exposição de Allan de Lana na galeria de Bolso da Casa de Cultura da América Latina resiste à escrita. Ele constitui um espaço á parte; Allan nos lança irremediavelmente a um espaço outro, onde elementos flutuam em um desdobramento espacial. A idéia dos furos e perfurações (já não recente nas pesquisas de Allan, mas só agora aberta ao público) não perde de vista a agressividade inerente no ato de perfurar, de vencer camadas, forçar caminhos e irromper superfícies. As pequenas inscrições pueris que Allan dispõe sobre as paredes revelam, de forma latente, essa agressividade. Mas há também nelas muita suavidade. A perfuração nessa obra se insere entre o ato violento de romper, e uma poética do não-limite, da não barreira, uma tentativa de igualar , reconciliar interior e exterior em um só espaço. A escolha de Allan pelos grafos e garatujas infantis parece, neste aspecto, bem acertado. Não se trata de uma ingenuidade, mas de uma clara percepção da infância e do infatil . O mundo também nos irrompe, nos adentra de forma violenta, por vezes com uma ambigüidade requintada (furar o papel não com a ponta do prego, mas com sua outra extremidade umedecida). Disso advém uma possibilidade de amplitude.
Os pregos na parede sustentam com certa suavidade os textos e inscrições poéticas. O prego desconhece (ou melhor: conhece mas despreza) os limites físicos da sala. Ele quer ir além, ir através... O enxame de maribondos (são todos um nesse jogo de réplicas, uma sequência de tipos) transfiguram-se em um só ataque, em uma só ferroada. Allan possivelmente não sabe, mas é discípulo inegável de Thanatus; seu furo aponta para uma possibilidade de equilíbrio de suspensão tensional, esse corpo perfurado é o corpo da não resistência, um corpo não mais tencionado, um corpo sem interior... um corpo que dissolve mediante a crueldade do furo, em escoamento e em total amplitude espacial.